Conhecim a Carlos entre as cores dum debuxo. Nom vim de forma direta a cor dos seus olhos mais sim sua mirada sobre as árvores, as pessoas, a música, a força da terra, a sensaçom dum páxaro no ar, a destreza dumha muinheira ou a ledícia dum sol que assoma tras um rio. Nom toquei suas mãos mais sei como som as curvaturas das suas letras, os “a” redondos ou os “m” com umha mui ligeira onda, quase sendo umha linha, caminhando por riba das pautas dum caderno. Tampouco participei com ele em debates de taberna mais escrevemos ideias e partilhamos pensamentos que acostados em papéis viajam em caixas e bolsas por outras terras baixo um fólio dobrado que leva debuxada a cara dum homem que nunca vimos pero que é real, que nom entende a nossa fala mais que governa em nós.
A primeira linha da minha primeira carta, a primeira linha da sua primeira carta, falamos à nossa maneira da empatia popular. Escrevo ogalhá de um golpe telepático che pudesse contar tudo o que quero expressar e ele resposta “depois de médio ano encerrado, acredito firmemente no poder “das ondas telepáticas do povo”. Continuo com a pergunta de como nos roubam palavras da nossa vida, por exemplo “jornalismo”, onde trabalho sem ter emprego, e ele resposta “passa-me como com palavras como democracia, uns dias penso que vale a pena luitar polo seu significado verdadeiro, e outros que como já está tam manipulado e deformado é melhor tirar ao lixo com a palavra e ficar com o significado”. Sorrio quando leio em ele que “nom se compra o que tampouco se vende” e imagino seu sorriso quando vê escrita a frase também em mim. Ler ilusom, esperança, povo, fé, força, amor… sem dúvida debuxa os melhores sorrisos porque som as ideias quem erguem os músculos da faciana, som sorrisos empáticos, os que dim que seguimos sendo pessoas no abrigo do primeiro plural, somos nós.
Nós somos todas as pessoas que choram, todas as que rim e todas as que berram. Somos a resistência das presas políticas, somos a luita das excluídas nos direitos reprodutivos e somos o direito da soberania dos povos, nós somos as dispersadas por políticas de gênero e de ideologia, somos as negras e as fusiladas nos cruzes de caminhos, somos a terra explorada, somos a memória histórica, as assassinadas por ser mulher, somos as trabalhadoras mais achouchadas polo sistema, as que lhes roubam a capacidade de luitar tendo como arma a miséria (cultural/econômica/social…), somos o carvalho, somos as raposas e os raposos, somos todos os sexos, gêneros e orientaçons inclassificáveis na dicotomia, nós somos a muinheira e somos Carvalho Calero, somos a história das avoas e os avós, nós somos Chelo Rodríguez e Moncho Reboiras, somos as mortas que seguem vivas e as vivas que seguem mortas. O primeiro plural é a igualdade da diferença, a uniom das plurais, o laço da solidariedade que nos une e o que nos faz fortes, somos nós. Criamos com atos cativos a mudança do nosso mundo próximo, e fazemo-nos a nós mesmas, distinguimos às pessoas entre as cores dum debuxo, vemo-nos sem ter que olhar e sem tocar conseguimo-nos sentir. Um povo é esse que luita por todas as pessoas que o componhem.
Dalgum modo, na mesma forma em que afastado e arrancado de nós, Carlos continua sendo o amigo, o filho, o amante, o mestre, o companheiro e aluno, Galiza segue a ser umha terra de sementes e um povo com gesto de se erguer. Estamos juntas e de volta, estamos à carga, e se esbaramos ou levamos golpes, soportarémo-lo porque já temos a consciência, já sabemos que nos imos pôr em pé.
Ana Viqueira, jornalista e ativista feminista